top of page

A multifatoriedade das Lesões no Esporte e no Futebol

Prof. Esp. Msc. Rodrigo Almeida


Os estudos das lesões advém de duas versões, uma de causa-efeito, dos aspectos biomecânicos e outra de uma visão ‘empírica’ da biomecânica em que muitos estudiosos do futebol se dedicam (NIGG & BOBBERT, 1990). Tal visão auxiliou na compreensão de cada tecido e sua resistência específica face a sua resposta perante a perturbação ambiental (ATLAN, 2006; BAHR et al., 2014) permitindo a criação de probabilidades usadas na sequência da prevenção de lesão em que se atesta o: 1) Conhecimento da extensão da lesão no esporte; 2) Estabelecimento da etiologia e mecanismos da lesão; 3) Introdução de medidas preventivas e; 4) Acesso da efetividade dos programas de intervenção (VAN MECHELEN et al., 1992). Para novamente se verificar o primeiro passo.


Entretanto, quando o estresse agudo ou contínuo supera a resistência específica do tecido biológico, mesmo abaixo dos seus limiares, há a geração de processos inflamatórios e há fadiga acumulada (RENSTRÖM & KONRADSEN, 1997; BAHR et al., 2014). Essa situação é suficiente para gerar dor e aumenta o risco lesão (NIGG, 1985; EKSTRAND et al., 2013).


Sem uma recuperação adequada, combinada com fatores intrínsecos e extrínsecos essa dor se torna um ciclo (RENSTRÖM & KONRADSEN, 1997), e nesse ponto já há lesão porque é definida[1] como qualquer queixa física atestada por um jogador que resulta do treino ou jogo de futebol, independente da necessidade de atenção médica ou tempo de ausência da prática do jogo (FULLER et al., 2006). Uma lesão que resulte num atendimento médico é referida como ‘lesão de atenção médica’ e uma lesão que inapta o jogador de continuar a atividade é definida como “tempo perdido em lesão” (FULLER et al., 2006). Mesmo com essas aproximações ainda muitas lesões menores são desprezadas (PETERSON et al., 2000).


Os seus mecanismos são dois: agudos ou por overuse, sendo bastante individualizados (CHOMIAK et al., 2000; ANDERSEN et al., 2003; BAHR et al., 2014). As de origem agudas ou traumáticas ocorrem de repente e tem fácil início (causa) estabelecida (EKSTRAND & NIGG, 1989; BAHR et al., 2014) sendo típicas de esportes de contato individuais e/ou coletivos sendo e, no futebol, ocorrem em sua maioria por duelos pela posse da bola como carrinhos e etc e/ou por mudanças bruscas de direção e velocidade podendo até suscitar reincidências (JUNGE et al., 2002; ARNASON et al., 2004a; BAHR et al., 2014). Os danos por overuse ou crônicos ocorrem gradualmente ao longo do tempo, pela continuidade da prática desportiva associada ao planejamento e, proveniente de sucessivos microtraumas e geralmente com intensidade crescente. São insidiosas e, por isso, dificilmente identificáveis podendo causar o overtraining (BEHRMAN et al., 2009; EKSTRAND & TORTVEIT, 2011; BAHR et al., 2014; CLARSEN et al., 2012).


Ambas são expressas por 1000 horas de exposição[2] aos treinos e jogos (STUBBE et al., 2014) em torno da sua severidade até ao retorno por completo (FULLER et al., 2006), situando-se geralmente como: Mínima (1 a 3 dias); Leve (4 a 7 dias); Moderada (8 a 28 dias); Severa (acima de 28 dias) (EKSTRAND & TORTVEIT, 2011; STUBBE et al., 2014) e; Final de carreira (FULLER et al., 2006; STUBBE et al., 2014).


Os principais fatores influenciáveis são os fatores de riscos, que dão complexidade às lesões e as colocam como multifatoriais (Adaptado de NIGG, 1985; NIGG & YEADON, 1987; EKSTRAND & NIGG, 1989; VAN MECHELEN et al., 1992; CHOMIAK et al., 2000; JUNGE et al., 2002; EKSTRAND et al., 2004a; ANDERSEN et al. 2004b; ARNASON et al., 2004a; BRITO et al.., 2012a).


Fatores Intrínsecos (Individuais): Idade avançada; Duração da carreira; Sexo, Lesões prévias; Fraqueza, rigidez e desequilíbrio muscular; Instabilidade articular e funcional; Falta de flexibilidade ou de alongamento; Condições clínicas (falta de condicionamento, défices nutricionais, amenorreia, obesidade); Inadequada reabilitação (dos tecidos); Pobre tempo de reação; Agressividade; Baixo nível de concentração, Desrespeito às regras e ao Fair-Play; Biomecânica alterada (diferença entre os membros, pés planos, cavos) e; etc.


Fatores Extrínsecos (Ambientais): Ausência de treino ou má qualidade do Treino; Baixa taxa de jogos; Inadequado Aquecimento ou retorno à calma; Excessos de carga ou de volume (treinos e jogos); Má execução técnica; Nível dos jogadores; Especialização precoce e Inadequada no esporte; Treinos em pisos inadequados para a modalidade; Inadequado programa de reabilitação; Tempo insuficiente de recuperação; Problemas com Equipamentos e materiais; Clima; Calendários congestionados e etc.


Esses fatores podem se combinar e se influenciar de forma intra e inter-relacionada no esporte e/ou com o quotidiano (sócio-comportamentais) ou sob condições casuais (VAN MECHELEN et al., 1992; CHOMIAK et al., 2000; DVORAK et al.., 2000; EKSTRAND et al 2004a; BEHRMAN et al., 2009; JENSON & KLIEGMAN, 2009; BAHR et al., 2014).

Assim sendo, se torna mais fácil a compreensão dos tipos de lesões existentes como torções, fraturas, estiramento, rupturas e etc., e seguem o Sistema de Classificação da Lesão no Esporte de Orchard (Orchard Sports Injury Classification System). (FULLER et al., 2006), sobretudo pelo seu padrão no futebol, apesar da variação cultural (STUBBE et al., 2014). Todavia transcorre, sobretudo, nos membros inferiores (ANDERSEN et al., 2003; ARNASON et al., 2004b) e são em maioria não são intencionais apesar de uma considerável parcela causada por jogo sujo no futebol (ANDERSEN et al., 2004a,c). Emergem com maior frequência nos 15 minutos finais de cada parte, principalmente na segunda parte sob níveis de fadiga elevados (WORREL & PERRIN, 1992; BRITO et al., 2012c; CARLING et al., 2015a; STUBBE et al., 2014; McCALL et al., 2014).


Assim pode-se compreender a multifatoriedade que é o mecanismo da lesão no Futebol e entendermos, que as lesões emergem casual e causalmente e, estão para além de uma simples abordagem. Contudo, é fundamental investir-se no treino como aspecto fundamental no processo de periodização.



Referências Bibliográficas



ANDERSEN, T.E., ENGEBRETSEN, L. & BAHR, R. Rule Violations as a Cause of Injuries in Male Norwegian Professional Football. As the Referees Doing Their Job? The American Journal of Sports Medicine. 32(1), Supl. 1, 62S-68S, 2004.

ANDERSEN, T.E., LARSEN, Ø., TENGA, A., ENGEBRETSEN, L. & BAHR, R. Football incident analysis: a new video based method to describe injury mechanism in professional football. British Journal of Sports Medicine. 37(3), 226–232, 2003.

ANDERSEN, T.E.; ARNASON, A.; ENGEBRETSEN, L. & BAHR, R. Mechanism of Head in Elite Football. British Journal of Sports Medicine. 38(5), 626-631, 2004a.

ANDERSEN, T.E.; FLOERENES, T.W.; ARNASON, A. & BAHR, R. Video Analysis of the mechanisms for Ankle Injuries in Football. The American Journal of Sports Medicine, 32(1), Supl l.1, 69S-79S, 2004b.

ANDERSEN, T.E., TENGA, A., ENGEBRETSEN, L. & BAHR, R. Video Analysis of Injuries and Incidents in Norwegian professional football. British Journal of Sports Medicine. 38(5), 626-631, 2004c.

ARNASON, A., ANDERSEN, T. E., Holme, I., ENGEBRETSEN, L. & BAHR, R. Prevention of Hamstring strains in elite soccer: an intervention study. Scandinavian journal of Medicine & Science in Sports. 18(1), 40-48, 2007.

ARNASON, A.; Sigurdsson, S. B., GUDMUNDSSON, A., Holme, I. & ENGEBRETSEN, L. & BAHR, R. Risk Factors for Injuries in Football. The American Journal of Sports Medicine, 32(5), Supl l., 5S-16S, 2004a.

ARNASON, A.; TENGA, A.; ENGEBRETSEN, L. & BAHR, R. A Prospective Video-Based Analysis of Injury Situations in Elite Male Football. Football Incident Analysis. The American Journal of Sports Medicine, 32(6), Supl l.1, 1459-1465, 2004b.

ATLAN, H. A organização biológica e a teoria da informação. 3ª Ed. Lisboa: Instituto Piaget, 2006.

BAHR, R. Recent Advances: Sports Medicine. BMJ: British Medical Journal. 23 (7308),328-331, 2001.

BAHR, R.; ALFREDSON, H., JÄRVINEN, M., JÄRVINEN, T., KHAN, K., KJOER, M., MATHESON, G. & MAEHLUM, S. Types and Causes of Injuries. The IOC Manual of Sports Injuries: An Illustrated Guide to the Management of Injuries in Physical Activity. Roald Bahr (Editor). Wiley-Blackwell Edition. Cap. 1. Publicado Online, 2012. Disponível em: http://onlinelibrary.wiley.com/book/10.1002/9781118467947. Acesso: 04 Maio de 2015.

BRITO, J., Fiqueiredo, P., Fernandes, L., SEABRA, A., SOARES, J.M., KRUTRUSP, P. & REBELO, A. Isokinetic strenght effects of FIFA’s “The 11+” injury prevention training programme. Isokinetics and Exercise Science. 18(4), 211-215, 2010.

BRITO, J., KRUTRUSP, P., & REBELO, A. The Influence of the playing surface on the exercise intensity of small-sided recreational soccer games. Human Moviment Science. 31(4), 2012a.

BRITO, J., MALINA, R.M., SEABRA, A., MASSADA, J. L., SOARES, J. M., KRUTRUSP, P. & REBELO, A. Injuries in Portuguese youth soccer players during training and match play. Journal of Athletic Training. 47 (2), p. 191-197, 2012b.

BRITO, J., FONTES, I., RAPOSO, A., KRUTRUSP, P. & REBELO, A. Postural stability decreases in elite Young soccer players after a competitive soccer match. Physical Therapy in Sports. 13(3), p.175-179, 2012c.

CARLING, C.; GREGSON, W.; McCALL, A.; MOREIRA, Al.; WONG, D.P. & BRADLEY, P. Match Running Performance During Fixture Congestion in Elite Soccer: Research Issues and Future Directions. Sports Medicine, 45(5), 605-613, 2015a.

CARLING, C; McGALL, A., LE GALL, F. & DUPONT, G. The impact of in-season national team soccer play on injury and player availability in a professional club. Journal of Sports Sciences. 0 (0),1-7, 2015b.

CHOMIAK, J; JUNGE, A.; PERTERSON, L. & DVORAK, J. Severe Injuries in Football Players. Influencing Factors. The American Journal of Sports medicine. 28 (5), 58-68, 2000.

CLARSEN, B. MYKLEBUST, G. & BAHR, R. Development and validation of a new method for the registration of overuse injuries in sports injury epidemiology. British Journal of Sports Medicine. 47, 495-502, 2012.

DVORAK, J.; JUNGE, A.; CHOMIAK, J.; GRAF-BAUMANN, T.; PERTERSON, L.; RÖSCH, D. & Hodgson, R. Risk Factor Analysis for Injuries in Football Players. Possibilities for a Preventions Program. The American Journal of Sports medicine. 28 (5), 69-74, 2000.

EKSTRAND, J.; NIGG, B.M. Surface-Related Injuries in Soccer. Sports Medicine, 8 (1), 52-62, 1989.

EKSTRAND, J.; ASKLING C.; MAGNUSSON, H. & MITHOEFER, K. Return to play after thigh muscle injury in elite football players: implementation and validation of the Munich muscle injury classification. British Journal of Sports Medicine. 47(12), 769-774, 2013.

EKSTRAND, J. & TORSTVEIT, M. K. Stress fractures in elite male football players. Scandinavian Journal of Medicine and Science in Sports. 22(3), 341-346, 2011.

EKSTRAND, J., WÁLDEN, M. & HÄGGLUND, M. A congested football calendar and the wellbeing of players: correlations between match exposure of European footballers before the World Cup 2002 and their injuries and performances during that World Cup. British Journal of Sports Medicine, 38 (4), 493-497, 2004a.

EKSTRAND, J.; WÁLDEN, M. & HÄGGALUND, M. A risk injury when playing in a national football team. Scandinavian Journal of Medicine and Science in Sports. 14(1), 34-38, 2004b.

FULLER, C. W.; EKSTRAND, J.; JUNGE, A.; ANDERSEN, T. E.; BAHR, R. DVORAK, J.; HÄGGLUND, M.; McCROY, P. & MEEUWISSE. W. H. Consensus statement on injury definitions and data collection procedures in studies of football (soccer) injuries. British Journal of Sports Medicine. 40(3): 193–201, 2006.

JUNGE, A. & DVORAK, J. Soccer Injuries. A review on incidence and prevention. Sports Medicine. 34(13), 929-938, 2004.

McCALL, A.; CARLING, C.; DAVISON, M.; NEDELEC, M. LE GALL, F; BERTHOIN, S. & DUPONT, G. Injury risk factors, screening tests and preventative strategies: a systematic review of the evidence that underpins the perceptions and practices of 44 football (soccer) teams from various premier leagues. British Journal of Sports Medicine. 0, 1-8, 2014.

NIGG, B.M. Biomechanics, load analysis, and sports injuries in the lower extremities, Sports Medicine 2:367–79, 1985.

NIGG, B.M. & BOBBERT, M. On the Potential of Various Approaches in Load Analysis to Reduce the Frequency of Sports Injuries. Journal of Biomechanics. 23, Supl l. 1, 3 – 12, 1990.

NIGG, B.M. & YEADON, M. R. Biomechanical aspects of playing surfaces. Journal of Sports Sciences, 5, 117-145, 1987.

RENSTRÖM, P. & KONRADSEN, L. Ankle Ligament injuries. British Journal of Sports Medicine.31, 11-20, 1997.

STUBBE, J.; VAN BEIJSTERVELDT, A.M.; VAN DER NKAAP, S.; STEGE, J.; VEHAGEN, E.; VAN MECHELEN, W. & BACKXX, F.J.G. Injuries in Professional Male Soccer Players in the Netherlands: A Prospective Cohort Study. Journal of Athletic Training. 49(3), 2014.

VAN MECHELEN, W.; HLOBIL, H. & KEMPER, H. Incidence, Severity, Aetiology and Prevention of Sports Injuries. A Review of Concepts. Sports Medicine. 14 (2), 89-99, 1992.

WORREL, T W. & PERRIN, D. H. Hamstring Muscle Injury: The Influence of Strength, Flexibility, Warm-Up, and Fatigue. Journal of Orthopaedic and Sports Physical Therapy, 16, 12-18, 1992.





[1] Podem ser encontradas outras definições em Ekstrand & Nigg (1989), van Mechelen et al. (1992), Peterson et al (2000), Junge et al. (2002), Ekstrand et al. (2004a), Arnason et al. (2004a), Clarsen et al. (2012), Bahr et al. (2014), Stubbe et al. (2014).


[2] Pela fórmula I = (n/e)*1000 onde n é o número de lesões no futebol são calculadas por temporada e e o total de exposição expresso como o total de horas de participação no futebol (STUBBE et al., 2014).



IMAGEM: http://desporto.sapo.pt/futebol/mundial/brasil_2014/artigo/2014/06/24/mundial2014-portugal-o-campe-o-das-les-es


bottom of page